Testemunho de Eduardo Tagliaferro no Senado Revela Supostas Trocas de Mensagens e Inversão de Ritos Processuais, Enquanto PGR Denuncia o Delator por Vazamento de Sigilos
Brasília, 04 de setembro de 2025 – Em uma audiência tensa na Comissão de Segurança Pública do Senado, o ex-chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Eduardo Tagliaferro, acusou o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, de atuarem fora dos ritos legais em investigações direcionadas a apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro. As alegações, apoiadas por prints de conversas no WhatsApp, sugerem um alinhamento indevido entre Ministério Público e Judiciário, invertendo o processo investigativo para justificar ações contra alvos políticos.
A sessão, presidida pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), ocorreu paralelamente ao início do julgamento de Bolsonaro e aliados por suposta tentativa de golpe de Estado no STF, em 2 de setembro. Tagliaferro, que atuou no TSE entre agosto de 2022 e maio de 2023, apresentou evidências que, segundo ele, comprovam que Gonet – então vice-procurador-geral eleitoral – solicitou relatórios e listas de investigados diretamente ao seu gabinete, para posterior repasse a Moraes. “Levantamos os processos, agora vamos pegar as decisões para o senhor”, respondeu um assessor em uma das mensagens exibidas, referindo-se a decisões sobre remoção de conteúdos em redes sociais.

De acordo com Tagliaferro, as trocas de mensagens continuaram até março de 2023, período em que investigações no STF já miravam empresários e políticos de direita. Ele relatou que Moraes encaminhou um vídeo a Gonet pedindo identificação do autor, e que o setor de combate à desinformação do TSE funcionava como “braço investigativo” informal do gabinete de Moraes, produzindo relatórios não oficiais para embasar decisões. “Todos os casos de perseguição começaram com a inversão do rito. Alexandre de Moraes já tinha em sua mente o planejamento de tudo que ele queria: aqueles alvos já estavam sentenciados”, afirmou Tagliaferro durante o depoimento, que foi transmitido ao vivo e incluiu a exposição do número de telefone de Gonet.
O contexto remete a reportagens da Folha de S.Paulo de agosto de 2024, que revelaram mais de 6 gigabytes de mensagens entre assessores de Moraes, incluindo Tagliaferro e o juiz instrutor Airton Vieira. Essas publicações indicaram que o gabinete de Moraes ordenava produções de relatórios pela Justiça Eleitoral para sustentar ações contra bolsonaristas no inquérito das fake news, durante e após as eleições de 2022. Tagliaferro também acusou Moraes de forjar documentos para justificar uma operação de busca e apreensão contra empresários bolsonaristas em agosto de 2022, baseada inicialmente em uma reportagem do portal Metrópoles, com relatórios elaborados retroativamente.
Em resposta, o gabinete de Moraes afirmou que todos os procedimentos foram “oficiais, regulares e documentados”, com requisições ao TSE seguindo normas regimentais e relatórios encaminhados à Polícia Federal e à PGR. A assessoria de Gonet, que participa do julgamento de Bolsonaro, optou por não se manifestar sobre as alegações específicas. No entanto, a PGR já havia denunciado Tagliaferro ao STF em 22 de agosto de 2025, por violação de sigilo funcional, coação no curso do processo, obstrução de investigações e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Gonet argumentou que o vazamento de informações teve o propósito de “incitar atos antidemocráticos” e alinhava-se a uma rede investigada por ataques às instituições. Tagliaferro, atualmente na Itália, é alvo de pedido de extradição solicitado por Moraes ao Ministério da Justiça.
Parlamentares da oposição reagiram com veemência. O senador Flávio Bolsonaro anunciou que a comissão aprovaria um relatório com as denúncias, a ser enviado ao presidente do STF, Luís Roberto Barroso, solicitando a suspensão do julgamento de Bolsonaro. Cópias seriam encaminhadas ao TSE, Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e até ao governo dos Estados Unidos. A comissão também aprovou o envio dos documentos às defesas dos réus do 8 de janeiro e requisitou proteção a Tagliaferro e sua família. A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) classificou as revelações como “motivos suficientes para justificar o impeachment de Alexandre de Moraes”. Já o senador Magno Malta (PL-ES) defendeu que as informações são “sólidas” e apontam para violações de direitos.

Do outro lado, fontes alinhadas ao governo e ao Judiciário veem o depoimento como uma estratégia bolsonarista para desestabilizar o julgamento em curso. A denúncia de Gonet contra Tagliaferro enfatiza que o ex-assessor estaria alinhado a condutas de uma “organização criminosa responsável pela tentativa de golpe de Estado”, sem, no entanto, apresentar diálogos diretos com investigados nessa trama. Críticos, como o jornalista Bernardo Mello Franco, argumentam que propostas de anistia pós-condenação representariam um “novo golpe de terno e gravata”.
As repercussões se estendem às redes sociais, com bolsonaristas pedindo a anulação das eleições de 2022 e liberdade para “reféns políticos”, enquanto apoiadores do governo destacam a defesa das instituições democráticas. O caso expõe tensões profundas no sistema judiciário brasileiro, com desdobramentos que podem afetar o julgamento de Bolsonaro e a credibilidade das investigações sobre desinformação e atos antidemocráticos. A comissão do Senado planeja ações imediatas, mas o STF ainda não se pronunciou sobre a suspensão solicitada.
Por Redação do GazetaMetropolitana.com
